Buracos Escuros – Novas perspectivas
Embora o termo “buraco escuro” somente tenha surgido no século XVIII, esse objecto era estudado desde o século XIV. Na época não tinha essa alcunha e foi simplesmente ignorado, pois, os investigadores não compreendiam como um ente não massivo, tal qual a luz, poderia ser influenciada pelo campo gravítico.
A humanidade somente aproximou deste tipo de objecto no século XXI, quando em 2016 foi confirmada a deteção de ondas gravíticas pelo LIGO. Apesar do avanço, para os mais cépticos, a Astronomia deveria mostrar um buraco escuro. E agora, pode ser que a Astronomia consiga mudar a concepção de muitos cientistas, afinal, uma equipa internacional de astrónomos está a trabalhar em um projecto que envolve os mais potentes telescópios da Terra. O objectivo é fazer o registo de um buraco escuro.
Buracos escuros podem, em princípio, serem entendidos como regiões do espaço-tempo onde o campo gravítico é muito intenso, a ponto de conseguir interagir com a luz.
Há tempos que os astrónomos já possuiam evidências da existência de buracos escuros super-massivos no centro de galáxias massivas. Para termos uma idéia, chamamos o buraco escuro de super-massivo quando sua massa encontra-se no seguinte intervalo: de um milhão até mil milhões de vezes a massa do nosso Sol. Com massa colossal, o buraco escuro consegue influenciar as estrelas que circundam ao redor do centro galáctico. Na fase “canibalismo”, eles se alimentam do material que se encontra espalhado no ambiente galáctico, claro, eles também podem expelir plumas detetáveis, além de jatos de plasma, que chegam a alcançar velocidades próximas à velocidade da luz.
O projecto LIGO somente fez com que as evidências da deteção de ondulações no espaço-temp nos saltassem aos olhos. Estimou-se que tais ondulações foram causadas pela fusão de dois buracos escuros de massa intermediária e tal colisão ocorreu há milhões de anos no passado.
Uma vez que sabemos da existência dos buracos escuros, queremos agora entender seu mecanismo de formação, evolução e como se dá sua influência no Universo. E nosso primeiro passo neste sentido se iniciará nesta próxima quarta-feira, dia 05 de Abril de 2017.
De facto, de 05 a 14 de Abril, uma equipa de astrónomos estará envolvida no EHT (que do inglês é: Event Horizon Telescope), trata-se de uma rede de telescópios estrategicamente posicionados para fazer as medições com a máxima precisão possível. A figura 02 está a mostrar os pontos onde os telescópios estão localizados. Ao se visualizar a Terra de longe, será como se todos aqueles telescópios formassem um grande telescópio instalado em nosso planeta. O EHT tem como ambição testar teorias fundamentais da Física dos buracos escuros, e claro, registar o horizonte de eventos de um buraco escuro. Chamamos horizonte de eventos ao ponto a partir do qual, como foi previsto em teoria, nada consegue escapar do buraco escuro.
A idéia central é interligar uma rede de radiotelescópios que formem o que seria um telescópio gigante do tamanho da Terra, no qual usaríamos a técnica de interferometria de linha de base muito longa e síntese de abertura da Terra. Em vista, o objecto de estudo é o centro da Via Láctea, local onde encontramos um buraco escuro com massa equivalente a quatro (04) milhões de vezes a massa do Sol – trata-se se Saggitarius A*, como mostrado na figura 01.
Você está a se perguntar: e como tudo isso acontecerá? Para responder a essa questão, temos que lembrar que é sabido pelos astrónomos a existência tanto de disco de poeira quanto de gás na órbita do buraco escuro. Assim, a luz que percorrerá esse trajecto sofrerá uma distorção devido ao campo gravítico do buraco escuro. Claro, tanto o seu brilho quanto sua cor serão alterados. O sinal esperado a ser capturado pelos instrumentos terá uma forma crescente e brilhante (figura 04), no lugar de forma de um disco (figura 03). Este procedimento, poderá, inclusive permitir que seja avistada a sombra do horizonte de eventos do buraco escuro contra o plano de fundo deste material brilhante e giratório (figuras 05 e 06).
Ao todo estão interligados nove (09) telescópios, distribuídos por toda a Terra. Alguns deles são individuais e outros são colecções de telescópios. Na fase pré-teste, tanto a resolução quanto a sensibilidade dos telescópios eram insuficientes para realizarem o estudo dos buracos escuros de maneira satisfatória. Porém, a inclusão de telescópios mais robustos, ALMA e SPT, por exemplo, deram à essa rede condições de estudo satisfatórias.
Vale salientar que no visível, os buracos escuros encontram-se cobertos pela colossal quantidade de gás e poeira. Entretanto, nada nos impede de realizarmos nosso estudo em outras faixas do espectro electromagnético, cita-se por exemplo, a faixa de rádio, que consegue penetrar toda a névoa cósmica.
A equipa do NEPA -Núcleo de Ensino e Pesquisa em Astronomia – adiantou-nos que quando falamos em resolução, estamos a pensar na capacidade de identificarmos, distinguirmos e medirmos as menores estruturas à uma dada distância da Terra. Geralmente, calculamos o poder de resolução de um telescópio como sendo a razão entre o tamanho de um objecto e a distância que ele está da Terra. Se fizermos esses cálculos para a nossa Lua encontraremos (0,5)° o que equivale a 1800 segundos de arco. No caso dos radiotelescópios, com 100 metros de abertura, por exemplo, a resolução será de 60 segundos de arco. Boa, não? Pois, agora interligue vários telescópios, como o EHT fará. Em seguida, refaça os cálculos e notará que a nova resolução será de 15 a 20 microssegundos de arco (ou seja, 0,000015 segundos de arco). Isso significa que o novo sistema de telescópio poderá ser capaz de identificar, distinguir e medir o diâmetro de uma moeda de 0,50 centavos mantida no solo lunar.
Você deve estar a pensar: fantástico! E como tudo isso funcionará? Bem, teoricamente tudo funcionaria dentro das normalidades. Porém, o EHT terá que ser capaz de centralizar todos os dados e todas as imagens para um supercomputador, o qual irá combinar tudo e devolver-nos em forma de uma imagem. Caso a missão cá na Terra seja bem sucedida, então, será possível registar imagens do material próximo da região do buraco escuro. Feito isso, a Ciência conseguirá dar um passo gigantesco nos estudos dos buracos escuros e poderá responder de vez algumas questões que estão em aberto, tais como: o horizonte de eventos realmente existe? A teoria da relatividade geral realmente funciona em regiões muito densas? Como os buracos escuros se alimentam? Qual tipo de material é rejeitado por ele? Teríamos de facto um buraco de verme? E o buraco branco, seria possível? Onde? Essas são algumas das inúmeras questões que poderão ser respondidas em breve.
Feito isso, o passo adiante será analisar todos os demais buracos escuros espalhados nas redondezas, isto é, aquelas que estão no Grupo Local. (Fiquemos atentos à Constelação de Orião, combinado?)