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Terra Yanomami completa 30 anos com maior devastação da história causada pelo garimpo

Terra Indígena Yanomamimaior reserva indígena do Brasil, completa 30 anos de demarcação e homologação nesta quarta-feira (25). Mas, diante do aumento desenfreado de garimpos ilegais dentro do território onde vivem mais de 28 mil ianomâmi, da destruição ambiental, dos casos de doença e violência, a celebração destas três décadas ocorre em forma de luta e resistência em defesa da reserva.

Com cerca de 10 milhões de hectares distribuídos no Amazonas e em Roraima, onde fica a maior parte, a Terra Yanomami tem 371 comunidades de difícil acesso espalhadas ao longo da densa floresta amazônica. O povo ianomâmi é considerado de recente contato com a população não-indígena. Além disso, na reserva há, ainda, indígenas isolados, sem contato ou influência externa.

Embora as condições geográficas os tornem isolados, isso não impede o avanço acelerado do garimpo. Em um ano, a devastação ambiental cresceu 46%, percentual histórico desde a demarcação (leia mais abaixo).

A situação em que vivem os ianomâmi é tão séria que foi considerada de “extrema gravidade e urgência”, com risco de “danos irreparáveis aos seus direitos no Brasil”, pela Comissão Interamericana da Direitos Humanos (CIDH). O órgão solicitou à Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) uma intervenção com medidas provisórias para proteger os direitos à vida do povo Yanomami.

Para marcar os 30 anos, lideranças indígenas realizam desde domingo (22) até esta quinta (26) uma festa restrita a convidados na comunidade Xihobi, região do Amazonas. Estima-se que cerca de 900 pessoas participem da celebração, entre eles, o líder indígena e ambientalista Ailton Krenak e o missionário Carlo Zacquini.

Processo de demarcação

 

Oficialmente demarcada em 25 de maio de 1992, o processo de avaliação e registro da Terra Indígena Yanomami durou quase 15 anos, o que envolveu uma longa batalha, com articulação internacional, até o governo brasileiro, à época presidido por Fernando Collor, homologar a reserva.

Para que uma terra indígena seja reconhecida, antes o espaço precisa passar pela demarcação física. Depois de delimitada a área, é feita a chamada homologação, etapa final do processo, quando o presidente da República publica um decreto criando a reserva.

Peça fundamental nesta conquista, o líder e xamã do povo Yanomami, Davi Kopenawa, se tornou a referência do seu povo.

 

“Por que eu luto? Porque estou vivo. Eu acredito na minha luta. Estou lutando para os novos, as crianças, os adultos do meu povo não morrerem tão cedo”, disse Davi Kopenawa em março de 1991, durante o processo pela demarcação.

 

A campanha a favor da homologação foi encabeçada pela entidade Comissão Pró-Yanomami e internacionalmente pela Survival International, uma organização não-governamental que defende os povos indígenas ao redor do mundo e até hoje atua em prol dos ianomâmi.

Davi Kopenawa, atualmente, é presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), a mais representativa organização deste povo. O filho dele, Dário Kopenawa, que é o vice-presidente, afirma que, mesmo diante das violações de direitos, os indígenas não desanimam e, de alguma forma, sentem alegria pela conquista e falam da importância dela para os jovens e crianças.

“[A situação] não está muito boa, mas nós estamos comemorando esse dia histórico para o povo Yanomami e Ye’kuana. Isso é para as gerações que vão lutar pelo seu território. Nós vamos falar da importância [da homologação] e ensinar sobre isso para os jovens e crianças. É uma grande alegria, felicidade e vitória. Uma grande conquista para nós”, afirmou.

 

À época da demarcação, Davi assumiu a missão de organizar os Yanomami e conscientizar os indígenas sobre as ameaças históricas, através de um programa de educação idealizado por ele e executado pela comissão. Ele também atuou como intérprete da língua Yanomami.

 

“Foi uma grande mobilização e super importante. A luta foi uma grande conquista para o povo Yanomami, uma grade de resistência. Nós fizemos uma grande jornada para demarcar”, afirma Dário.

 

Com a homologação, o que deveria ser uma conquista também virou um pesadelo. Há décadas, a Terra Yanomami é alvo de garimpeiros que buscam ouro, cassiterita e outros minérios. A Hutukara estima que atualmente há 20 mil garimpeiros explorando ilegalmente a região.

A presença dos invasores causa desmatamento, provoca poluição dos rios e impacta diretamente na saúde dos ianomâmi que vivem nas comunidades – sem contar os conflitos armados. Ano passado, em maio, garimpeiros abriram fogo contra a comunidade Palimiú, às margens do rio Uraricoera, umas das principais rotas usada pelos garimpeiros. Até hoje, a situação é de tensão.

 

“Os garimpeiros nunca saíram e as autoridades não estão preocupadas em retirá-los”, diz Davi sobre os ataques a Palimiú.

 

 

Avanço do garimpo e desmatamento

 

Atividade garimpeira tem provocado a poluição dos rios na Terra Yanomami, conforme a HAY. — Foto: © Bruno Kelly/HAY/Arquivo
Atividade garimpeira tem provocado a poluição dos rios na Terra Yanomami, conforme a HAY. — Foto: © Bruno Kelly/HAY/Arquivo

 

 

Em meio ao avanço dos garimpos, visível na cor da água lamacenta dos rios e nas crateras a céu aberto, e ao aumento da violência, os números também endossam o estrago: a reserva vive a pior devastação da história, com 46% de aumento em um ano.

Relatório “Yanomami sob ataque”, divulgado pela Hutukara em abril deste ano, apontou que, em 2021, a degradação causada pelo garimpo chegou à marca de 3.272 hectares, frente aos 2.234 hectares de 2020 — 1.038 hectares a mais em um ano.

Em quatro anos, de outubro de 2018 até o fim de 2021, a área destruída pelo garimpo ilegal quase dobrou de tamanho, ultrapassando 3,2 mil hectares.

As regiões com maior degradação causada pelo garimpo são, respectivamente, Waikás, Homoxi e Kayanau. Com exceção das regiões Surucucu, Missão Catrimani e Uraricoera, todas as áreas tiveram um crescimento na degradação de 2020 até o fim de 2021.

 

O número de comunidades afetadas diretamente pela extração ilegal seria de 273, abrangendo mais de 16 mil pessoas, ou 56% da população Yanomami.

 

Voo realizado em janeiro pela HAY flagrou o avanço do garimpo e destruição ambiental na Terra Yanomami. — Foto: © Bruno Kelly/HAY/Arquivo
Voo realizado em janeiro pela HAY flagrou o avanço do garimpo e destruição ambiental na Terra Yanomami. — Foto: © Bruno Kelly/HAY/Arquivo

 

Com informações do g1 Roraima

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